Publicado por: Rudolfo Lago | 11 jun 2021
Na avaliação de alguns generais do Alto Comando, a decisão tomada pelo comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, de não punir o general Eduardo Pazuello não se deu porque o Exército estaria fechado com o projeto do presidente Jair Bolsonaro e pronto para seguir com ele para o que der e vier. A decisão se deu mais por receio. Se deu mais por medo.
Na viagem que fez acompanhado de Paulo Sérgio para inaugurar uma ponte de madeira de 20 metros que já existia e estava em uso, Bolsonaro deixou claro para o comandante do Exército que uma eventual punição de Pazuello seria um problema grande. Porque ele, Bolsonaro, como comandante que é das Forças Armadas, conforme a Constituição, não aceitaria a punição e poderia até revogá-la. Além disso, dentro das tropas da militância bolsonarista, trataria de transformar Pazuello em vítima, em mártir do seu movimento.
Eis aí o ponto central. O episódio acrescentaria mais gasolina na fogueira que Bolsonaro cuida de manter meticulosamente acesa desde que começou a amadurecer como solução para quem estava insatisfeito com os governos petistas e transformou essa insatisfação em manifestações de protesto desde a Copa das Confederações em 2013. O atual presidente começou desde aí a arregimentar um grupo que, ao longo do tempo, parece disposto a tudo para defendê-lo e chamá-lo de mito. O “meu exército” do qual Bolsonaro fala o tempo todo é esse. Não é o Exército formal. Muito menos são os seus generais.
Um desses generais, por exemplo, uma vez confidenciou que o ex-comandante do Exército no governo Michel Temer, general Villas Boas, não votou em Bolsonaro no primeiro turno. Votou no segundo, por não querer a opção contrária, Fernando Haddad, do PT. Como Villas Boas, boa parte desses generais foi em direção de Bolsonaro por imaginar que as Forças Armadas poderiam com ele obter uma redenção, desde o ostracismo em que ficaram depois da redemocratização do país.
Apostaram na possibilidade de controlar a imensa vocação que Bolsonaro tem para a confusão, para a entropia, para o estímulo à falta de disciplina e ao desprezo à hierarquia. Não conseguiram.
Bolsonaro tornou-se alguém conhecido e começou a sua carreira com um ato de insubordinação, que lhe valeu uma prisão disciplinar, que negou agora a Pazuello. Ele escreveu um artigo que foi publicado na revista Veja reclamando da remuneração dos soldados. Desde então, sua principal base política são os soldados de baixa patente e os policiais militares. Sua base nunca foi a alta oficialidade.
Parte do “exército” de Bolsonaro são, então, seus militantes dispostos a tudo. Mas a outra parte, muito mais letal e perigosa, o seu braço armado, são justamente esses militares de baixa patente e os policiais militares. Nas manifestações em Recife, há duas semanas, é muito difícil acreditar que os PMs erraram duas vezes quando acertaram os olhos de dois manifestantes. Ninguém atira no olho de alguém por acidente. Muito menos atira no olho de alguém por acidente em duas ocasiões seguidas.
Esse é o temor dos militares quando passaram a mão na cabeça de Pazuello. Em algum momento, eles temem que essa fogueira acesa atinja grandes proporções, como aconteceu na invasão do Capitólio nos Estados Unidos após a derrota de Donald Trump. Se alguém invadir aqui o Congresso, de que lado estará a PM? De que lado estarão os soldados de baixa patente? Poderá ser essa a hora de os generais intervirem.