Publicado por: Rudolfo Lago | 27 dez 2023
No livro em que dissecam a disputa política brasileira, o cientista político Felipe Nunes, diretor do Instituto Quaest, e o jornalista Thomas Traumann sugerem que o estado de polarização política brasileiro, com boa parte do país dividido entre os que idolatram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os que amam o ex-presidente Jair Bolsonaro não é fenômeno passageiro. Os dois criam, inclusive, um novo termo para explicar o que acontece. Não seria mais polarização, seria “calcificação”. Ou seja, a divisão que surgiu especialmente antes da eleição de Bolsonaro em 2018 tornou-se algo permanente, parte do corpo, não dá mais para separar. A questão agora será avaliar como se comportarão os demais atores da política brasileira.
Pareceu haver em alguns momentos esforços de reconciliação nacional. Que esbarraram na forte reação da realidade brasileira. A sessão de promulgação da reforma tributária na semana passada acabou se tornando um resumo veemente dessa distância entre intenção e gesto.
Enquanto do alto da Mesa do plenário, os comandantes dos três poderes festejavam a promulgação da reforma, em baixo os deputados xingavam-se e acabaram saindo no braço, quando Washington Quaquá (PT-RJ) virou um tapa em Messias Donato (Republicanos-MG).
Até onde poderão funcionar os freios de arrumação?
Tal situação não parece ser uma exclusividade brasileira. A calcificação da polarização política repete-se também em outros países. Em “Como as Democracias Morrem”, os analistas norte-americanos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt narram alguns momentos em que grupos políticos movem-se para tolher eventuais arroubos autoritários, às vezes até com movimentos mais polêmicos e questionáveis. Isso parece acontecer agora tanto nos Estados Unidos contra Donald Trump quando por aqui com Jair Bolsonaro. Diante da “calcificação” dos extremos, movimentos assim poderão ter sucesso? Ou vão gerar forte reação?
O Correio Político ouviu o cientista político André Cesar. Nos EUA, tal caminho poderia vir pela ampliação da decisão do estado do Colorado contra Trump pela Suprema Corte. O Colorado tornou Trump inelegível. Para André, tal ampliação é improvável.
Já no Brasil, André avalia que parece haver junto às autoridades no comando especialmente do Judiciário uma disposição maior de tolher Bolsonaro. Além disso, aparentemente as investigações reuniram mais evidências da eventual participação de Bolsonaro.
Aqui, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já tornou Bolsonaro inelegível. Sua participação nas próximas eleições já não será direta, mas como cabo eleitoral. Diante das evidências obtidas nas investigações da Polícia Federal e do STF, porém, pode-se avançar para novas condenações.
A questão, porém, será como a sociedade reagiria. Uma dose excessiva pode transformar Bolsonaro em vítima (o mesmo pode acontecer com Trump nos EUA). Gerando uma reação forte da sociedade. Enfim, se a polarização está calcificada, ela não irá se extinguir.