Publicado por: Rudolfo Lago | 29 fev 2024
De forma ainda silenciosa, começa a crescer nos bastidores do governo uma briga que pode ter potencial semelhante à que envolveu Marina Silva e Dilma Rousseff em 2008 por causa da usina hidrelétrica de Belo Monte. Na ocasião, Marina acabou saindo do governo Lula afirmando que os interesses de Dilma no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ameaçavam as questões ambientais. Marina era ministra do Meio Ambiente, como agora, e Dilma a ministra da Casa Civil, a “mãe do PAC”, forjada por Lula para sucedê-lo. Agora, briga semelhante envolve a Base Espacial de Alcântara e a comunidade quilombola que vive na região, na ilha do Maranhão onde está instalada a estação brasileira de lançamento de foguetes.
A Base de Alcântara é a estação de lançamento mais próxima do Equador em todo o planeta. Isso a transforma em um ponto estratégico, porque confere um ângulo perfeito para a decolagem dos foguetes, que só tem semelhança com a base da Guiana.
Ocorre que a base ocupa uma área tradicionalmente ocupada por comunidades quilombolas na ilha. Em 1982, quando a base que foi criada, a ditadura militar simplesmente ignorou as comunidades, gerando ali um conflito territorial que, agora, emerge.
Defesa quer ampliar o tamanho da base
O Ministério da Defesa quer ampliar o tamanho da Base de Alcântara dos atuais 87 quilômetros quadrados para 213 quilômetros quadrados. Isso implicará invasão maior da área ocupada pelas comunidades quilombolas. Até janeiro, elas participavam de um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) que discutia uma solução conjunta para a questão. Deixaram o grupo, então, quando desconfiaram que poderiam acabar perdendo na disputa interna, pela pressão especialmente militar. Na terça-feira (26), a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, estiveram em Alcântara.
A representante do Movimento dos Atingidos pela Base, Dorinete Serejo Moraes, foi clara com os ministros: “Nossa pauta principal é a titulação integral do território étnico quilombola”. Ou seja, ela deixou claro que os quilombolas não negociam o tamanho do território.
E os ministros, por sua vez, pediram à comunidade que retorne ao GTI porque somente assim poderia se retomar, na avaliação deles, uma negociação. Essa não parece ser a intenção dos quilombolas. A não ser que percebam a possibilidade de ter mais força na negociação.
O problema é que o governo, envolvido com outros problemas, evita agora mexer em mais esse vespeiro com os militares. Os quilombolas reclamam que o governo estaria cedendo à “sedução” do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e cedendo à pressão.
De qualquer modo, diante da confusão, o governo optou por fazer um registro mais discreto da passagem dos ministros por Alcântara. A polêmica, porém, vai avançar. Com potencial para levar a divisões entre ministros parecidas com as de Marina e Dilma.