Publicado por: Rudolfo Lago | 25 mar 2024
É realmente curiosa a forma como o ex-presidente Jair Bolsonaro espelha-se o tempo todo em seu arqui-inimigo, o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O fôlego que eventualmente Bolsonaro possa ganhar com o desabafo vazado do tenente-coronel Mauro Cid é um ensaio de caminho da nulidade processual. Exatamente o mesmo rumo que tomaram as investigações contra Lula depois que vazaram as conversas do hoje senador Sergio Moro (União-PR) com o então procurador Deltan Dallagnol. Ou seja: se assim avançar o plano para Bolsonaro, ele legitima que o mesmo tenha acontecido antes com Lula, dando razão àquele que chama de “descondenado”, sobre a sequência que o levou de volta à Presidência da República.
No caso, Bolsonaro criaria um arcabouço para reforçar o que diz Mauro Cid no áudio vazado: criou-se uma situação para fazer com que seu ex-ajudante de Ordens confirmasse uma versão que lhe chegou pronta. Uma combinação, como fizeram Moro e Dallagnol com Lula.
O outro caminho possível é o áudio vazado acabar dando em nada. Como a frustrada tentativa que o ex-presidente Fernando Collor fez para anular o seu processo de impeachment na mambembe tentativa durante a CPI do PC conhecida como “Operação Uruguai”.
Collor tentou justificar com um falso empréstimo
Quando a CPI do PC tinha diversos elementos que demonstravam que o alto padrão de vida, além das suas possibilidades, do então presidente Fernando Collor era bancado de maneira irregular por seu ex-tesoureiro Paulo Cesar Farias, o PC, surgiu a história de um empréstimo tomado no Uruguai, de US$ 3,75 milhões, que permitiria a Collor viver de forma nababesca. Era uma farsa. Que foi revelada na CPI por Sandra Fernandes, que trabalhava em uma empresa à época que participou da armação. A CPI foi à época a Montevidéu e verificou como era fácil obter certidões em branco no país. Na época, acompanhei essa viagem.
A Operação Uruguai fracassou em 1992. Mas ajudou Collor a não ser condenado na Justiça. As conversas da Vaza Jato anularam as condenações contra Lula. Agora, é o caso de saber para qual dos dois rumos avançará a história do desabafo vazado de Mauro Cid.
Na sexta-feira (22), depois do vazamento, Mauro Cid voltou à Polícia Federal. Oficialmente, diz-se que ele “não lembra” com quem falava quando fez o desabafo. Mas há quem acredite que ele disse. E que a Polícia Federal guarda sob sigilo essa informação.
Isso sustentaria a nova prisão, justificada pelo descumprimento das medidas cautelares que davam a Cid liberdade provisória. A provável medida cautelar que ele descumpriu teria sido falar com outro dos investigados. Se foi preso por isso, é porque se sabe com quem falou.
Assim, ele pode ter sido induzido a dizer aquilo. Ou dito para agradar ao interlocutor. O fato é que boa parte do que Cid disse ou que apareceu na apuração já foi corroborada por outras investigações. É por isso que, ao final, o efeito poderá ser como o de 1992.