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AMIGOS… PERO NO MUCHO!

Publicado por: Alexandre Jardim | 21 maio 2020

Se tem um filme que descreve bem as relações entre o Tio Sam e los hermanos latinos é “Feito na América” com Tom Cruise no papel principal. Lançado em 2017, Barry Seal(nome do personagem de Cruise), é um piloto de avião que trabalha – simultaneamente – para a CIA e para os traficantes do Cartel de Medelín (Colômbia). É um filme de ação, baseado em fatos reais, que mostra a relação política entre as Américas – do Sul e do Norte – na ótica dos Estados Unidos (EUA). Na trama filmada, os latinos são apreciados quando úteis e descartados quando não são mais. O filme, que se passa entre voos e aeroportos, chama a atenção após a possibilidade dos aviões brasileiros serem banidos dos aeroportos norte americanos. No enredo, Barry Seal é um piloto comercial (TWA) recrutado pela Agência de Inteligência (CIA) para monitorar rotinas de governos da América Latina com relação às políticas em curso e o “risco” de atrelamento à esquerda. A história se passa na década de 80 e entre “aliados” e “inimigos” fica claro que, nos EUA, esses termos podem ser usados para um mesmo personagem a depender do que ele faz e de qual interesse atende. Até os barões da Coca são mostrados como aliados enquanto serviram aos interesses do Governo dos USA naquela época. (Se ainda não entendeu a razão da foto acima, o convido seguir até o final).  

No filme é possível entender que nem tudo que serve aos Estados Unidos da América serve aos países latino americanos. Nele, a trama destaca bem quando esse “intercâmbio” é interessante e quando ele não é. O que chama a atenção é que, como no filme, os governantes sul americanos continuam servindo aos propósitos dos “Irmãos do Norte” numa relação conveniente. Essa “relação” já inspirou muitos filmes em Hollywood, que revela em seus longas como a conveniência pode virar subserviência a depender do ângulo de visão. Apesar da forma deles fazerem política inspirar governantes pelas bandas de cá, nas bandas de lá o governante mostra que não quer uma amizade tão próxima assim com a turma daqui.

“Não quero que as pessoas venham aqui e infectem o nosso povo”; disse o presidente dos EUA, Donald Trump, se referindo ao Brasil, nesta semana, durante uma reunião com seu gabinete para depois afirmar ainda que está considerando impor uma proibição de entrada de viajantes do nosso país por sermos o terceiro lugar com o maior número de pessoas infectadas no mundo. Pense bem como se desenrola isso!

Para acentuar ainda mais esse desejo de distanciamento entre os de lá e os de cá, bastam os sinais visíveis de que o povo latino americano nem sempre foi “bem vindo” como mostra a construção de um muro para impedir a entrada de sul americanos pela fronteira mexicana e a – radical e insensível – separação de pais e filhos de imigrantes presos. Entre eles há também brasileiros nessa situação por viverem ilegalmente por lá. Porém, a ojeriza ao povo latino não foi suficiente para que os brasileiros deixassem de acreditar que o American Dream não é pra todos. Se no passado foi, atualmente não é. Virou um sonho para brancos que falam inglês e não para os brazucas. O problema dessa segregação é que complica a vida por lá. Acontece que os americanos não fazem determinados serviços e a escassez deste tipo de trabalhador desestabiliza o “sonho DO americano”. Por isso, ele ainda reserva espaço para os que aceitam limpar banheiros, lavar louças, pintar ruas e calçadas ou estacionar carros. Para os estadunidenses, latinos serão sempre “bem vindos” como mão de obra barata ou quando vão para gastar muitos dólares. Vale esclarecer que o termo brazuca é como nós – brasileiros – somos identificados. Afinal, lá nós não viemos do Brasil mas sim do Brazil. 

Essa forma dos americanos se relacionarem conosco é fácil de ser percebida quando se está em Miami. No mês passado, por exemplo, em um encontro com o governador da Flórida(EUA), Ron DeSantis, o presidente Trump disse que se precisasse interromper os voos entre o Brazil e os USA era só lhe avisar para determinar a proibição. “O Brazil tem um surto sério, como vocês sabem”, afirmou Donald Trump e continuou: “Eles também foram em outra direção que os outros países da América do Sul, se você olhar os dados vai ver o que aconteceu infelizmente com o Brazil”. Apesar desta relação entre “primo rico e primo pobre”, no Brasil (com S) ainda há uma predileção que inspira os nossos governantes. Para se ter uma ideia do tamanho desse apreço, em 23 de março, o governo federal restringiu a entrada de estrangeiros vindos da Ásia, Europa e Austrália mas manteve a entrada de quem vem dos Estados Unidos liberada apesar daquele ser o país com o maior número de infectados pela COVD-19 no mundo. Isso sem falar do triste número de mortes por lá.

Só pra lembrar como se dão essas relações, após a comitiva do governo brasileiro visitar os Estados Unidos, no início de março, e de lá trazer o Coronavírus para o Brasil, nada foi feito por aqui em termos de restrições. Já nos EUA, o desejo de impedir o pouso de aviões brasileiros em aeroportos daquele país é eminente pelo Brasil ser visto como um risco aos americanos. Vale lembrar que entre os primeiros contaminados da COVID-19, logo que foi detectada a doença no Brasil, apareceram casos entre os integrantes da comitiva presidencial brasileira. É importante ainda lembrar que o primeiro caso brasileiro foi confirmado em 26 de fevereiro de um homem vindo da Itália. Uma conclusão dos estudos feitos por aqui diz que a maior parte dos infectados vieram da Europa e da Ásia. Apesar desta constatação, cerca de 10 dias depois deste primeiro caso, a comitiva presidencial brasileira pousou na Flórida para uma estadia de menos de uma semana naquele país e, nesse pouco tempo, 23 pessoas da comitiva foram contaminadas com a COVID-19. Mesmo assim, o Brasil não pensa em restringir os voos vindos dos Estados Unidos. A ideia que circula por aqui é a de que quando um amigo está doente, o melhor é faze-lo circular do que retira-lo do convívio.

Depois de tanto falar das relações entre o Brasil e os Estados Unidos e, principalmente, por ter feito um convite lá em cima para que comigo permanecesse até o final, você deve estar se perguntando o que tem a ver a foto que ilustra esse artigo com o que foi dito até aqui. Ocorre que até esse momento a ideia não foi expor as condutas de um parceiro e “velho amigo” ou julgar se ele deve ou não ser como é! A foto acima – como a célebre frase do filósofo chinês Confúcio (552 AC e 479 AC) que diz “uma imagem fala mais do que mil palavras” – serve apenas para nos fazer refletir em quem e onde devemos buscar inspiração. Ela mostra uma cena comum do cotidiano de muitas pessoas e não teria nada demais se não tivesse retratado o Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, que neste último domingo serviu de inspiração a todos que respeitam as normas definidas para o combate do Coronavírus (desde o uso da máscara até o distanciamento entre pessoas) numa foto que fala por si…

Alexandre Jardim