O semestre terminou com o governo começando a admitir que não irá vencer na questão de dar maior autonomia ao Banco Central (BC). Na última sessão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o líder do governo, Jaques Wagner (BA), admitiu negociar a independência financeira e administrativa do BC, desde que ele não vire empresa, como está na Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Na ocasião, diante da clara admissão de cessão do governo, o relator do projeto, Plínio Valério (PSDB-AM), aceitou o adiamento para o início do próximo semestre. Agora, porém, começa-se a desconfiar que possa haver aí uma pegadinha. O governo começou a ventilar a ideia de uma mudança mais ampla no banco.
As discussões que começaram a ser ventiladas são no sentido de adotar um modelo que o mundo financeiro apelida de “Twin Peaks”. Literalmente, significa “picos gêmeos”. Na prática, é unir todo o controle das autoridades da economia numa única instituição.
Quem é mais velho vai lembrar que esse também era o título de um famoso seriado de televisão do diretor David Lynch. Um seriado para lá de bizarro passado numa cidade norte-americana com esse nome. Teme-se que por trás da história haja bizarrice parecida.
Ideia é unir toda a supervisão financeira
A ideia surgiu primeiro na Austrália e depois foi adotada também no Reino Unido. Consiste em unir toda a supervisão do sistema financeiro. Daí a ideia dos picos gêmeos. No caso brasileiro, seria juntar três órgãos em um só. O Banco Central é quem cuida do mercado financeiro. A Comissão de Valores Monetários (CVM) fiscaliza o mercado de capitais. E a previdência é monitorada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) e pela Superintendência de Previdência Complementar (Previc). A primeira cuida da previdência privada, e a segunda dos planos de previdência complementar. O governo parece estudar usar a PEC para isso.
Nesta segunda-feira (22), estava na agenda de Gabriel Galípolo, que está interinamente na presidência do BC, uma reunião com o superintendente da Susep, Alessandro Octaviani, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Desconfiou-se que o tema seria o “Twin Peaks”.
Os senadores favoráveis à PEC reclamam que uma modificação dessa amplitude não estava no acordo feito por Jaques Wagner quando adiou a discussão no final do primeiro semestre. O acordo era em torno do que já está na PEC, somente em torno de virar empresa.
Uma mudança maior unindo todas as instituições seria algo mais complexo. Que exigiria uma discussão maior. Ou seja: acabaria travando agora a tramitação da proposta. Adiaria, assim, a sua aprovação. Se for uma jogada do governo, haverá reação.
Em princípio, a ideia na CCJ é pautar a PEC de autoria de Vanderlan Cardoso (PSD-GO) e relatada por Plínio Valério para a primeira sessão da CCJ logo após o final do recesso. Mas agora tudo depende de entender até onde vai essa nova articulação do governo.