Publicado por: Rudolfo Lago | 19 set 2024
Em 2007, o cientista político e sociólogo Alberto Carlos de Almeida escreveu o livro “A Cabeça do Brasileiro”. A partir de pesquisas, Alberto Carlos comprovava teses do antropólogo Roberto da Matta e outros pesquisadores a respeito de como pensa a sociedade brasileira. Demonstrava, por exemplo, que há no imaginário do cidadão médio uma ideia hierárquica, que compromete a igualdade efetiva. Em uma das perguntas da pesquisa, por exemplo, o cientista político perguntava às pessoas qual deveria ser a atitude de um empregado caso o patrão lhe dissesse que ele poderia usar a piscina do edifício. A resposta de 65% foi de que ele deveria agradecer e não tomar banho na piscina. Para ele, tal imaginário não pode ser desprezado.
Não que Alberto Carlos ratifique ou defenda tal comportamento. Mas, para ele, ao tentar forçar situações que a sociedade brasileira estranha, a esquerda estaria se distanciando do brasileiro médio. “O pardo, por exemplo, não acha que é negro”, exemplifica.
Para Alberto Carlos de Almeida, algumas das pautas identitárias não seriam bem assimiladas. E podem ser a causa dos problemas eleitorais da esquerda no momento. “A esquerda não deveria apenas importar essas pautas. Mas entendê-las no contexto brasileiro”.
Lula não cometeria esse mesmo erro
Na avaliação de Alberto Carlos de Almeida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não cometeria esse erro. Ele consegue ter uma visão mais próxima da cabeça do brasileiro médio. E fala a língua dessas pessoas na forma como elas compreendem. Por isso, teria na maioria das vezes um desempenho individual melhor que o do PT ou da esquerda na média. “Lula sempre foi muito povo brasileiro”, considera o cientista político. Assim, o próprio Lula continuará tendo um papel político importante, com chance grande de reeleição. Mas acentuando as dificuldades de agora, convivendo com um Congresso conservador e minoria agora de prefeituras.
Para Alberto Carlos de Almeida, o caminho seria conseguir chegar a um meio termo no qual as questões de gênero e raciais fossem abordadas levando em conta a cabeça média do brasileiro, a forma como ele se enxerga e enxerga sua vida e seus problemas.
Quando, por exemplo, para o cientista político, avançou-se sobre o que se tornou legal sobre a questão do aborto, foi quando o tema foi tratado como questão social e de saúde pública, no contexto das dificuldades vividas pelas mulheres especialmente na periferia.
“O grande problema de gênero no país é a violência doméstica”, sustenta Alberto Carlos. “Nesse sentido, a questão é compreendida bem melhor do que quando se fala da suposta liberdade da mulher sobre seu corpo, um discurso não bem compreendido”.
Da mesma forma, o Brasil conseguiu avançar na política de cotas também a partir da percepção da desigualdade social. “É possível abordar a questão racial e de gênero a partir da própria experiência brasileira, respeitando a forma como a sociedade se enxerga”.