Publicado por: Rudolfo Lago | 13 set 2024
Quando surgiu durante a Constituinte, o Centrão já era símbolo do fisiologismo. Tanto que seu líder à época, o ex-deputado Roberto Cardoso Alves subvertia verso da oração de São Francisco de Assis para resumir a atuação do grupo: “É dando que se recebe”. Assim agiu o Centrão na Constituinte, trocando na época benesses por, por exemplo, mais um ano de mandato para o então presidente José Sarney. Mas o Centrão da Constituinte tem as mesmas características do atual Centrão? Esse é o tema de um estudo feito pelos cientistas políticos Graziela Tesla, Lara Mesquita e Mauro Bolognesi, com informações inicialmente publicadas no Congresso em Foco e na íntegra na revista CRH, da Universidade Federal da Bahia.
Os cientistas políticos fizeram uma pesquisa junto aos deputados federais para definir o atual Centrão. E concluíram que há diferenças importantes quanto ao Centrão da Constituinte em termos de atuação. Por isso, batizaram o atual grupo de “Centrão 2.0”.
O que os três cientistas políticos concluem é que o atual Centrão é ainda mais fisiológico e clientelista que o da Constituinte, que já tinha surgido com essa característica. Praticaria mais o que chamam de “conservadorismo de conveniência”, mais pragmático.
Uma agenda mais individual e egoísta
“O conservadorismo e a agenda liberal deixam de ser base do Centrão pela agenda fisiológica do clientelismo”, afirmam no estudo os cientistas políticos. “O que vemos é uma mudança no sentido da atomização do papel dos partidos políticos como principais interlocutores com o governo e uma agenda baseada exclusivamente em benefícios egoístas”. Ou seja, é uma agenda mais no varejo, “sempre através da liberação de verbas para que os parlamentares possam manter sua representação territorial ativa e garantir a reeleição”. E seus integrantes não demonstram exatamente muita fidelidade partidária, observa o estudo.
Pela pesquisa, os próprios deputados identificaram PP, Republicanos, PL, PTB, MDB, União Brasil, Patriota, Podemos e PSD como os partidos que hoje compõem o Centrão. Mas isso não significa um alinhamento. Mais do que posições ideológicas, o que importa é o poder.
A liderança partidária é menos importante. O estudo mostra que os membros do Centrão mudam mais de partido que os demais parlamentares, na média. Antes de chegar à Câmara, em média eles mudaram 2,05 vezes de partido, enquanto os demais mudaram 1,67 vezes.
Assim, os integrantes do Centrão estão menos interessados na orientação e na coesão partidária. Não por acaso, nesse sentido, os partidos identificados como os que compõe o grupo são os que mais liberam as suas bancadas nas votações em plenário, mostra o estudo.
Entender esse processo é importante diante da imprevisível sucessão da Câmara. Orientações de comandantes talvez não sejam tão importantes. Os pragmáticos do Centrão farão de tudo para não apostar no cavalo errado. O Centrão não embarca em canoa furada.