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Crônica do jogo embolado

Publicado por: Rudolfo Lago | 12 dez 2020

O ex-presidente Tancredo Neves costumava dizer que reunião boa é aquela em que tudo já está combinado antes mesmo dela começar. Isso vale também para as eleições em petit comité, como a própria eleição no Colégio Eleitoral que ele venceu para por fim à ditadura militar. As eleições que vão acontecer em fevereiro para definir os novos comandos da Câmara e do Senado são semelhantes. Eleições em colégios fechados. Nelas, o jogo também fica bem melhor quando está tudo combinado antes dele começar.

Quando isso não acontece, o jogo se torna imprevisível. No caso mesmo de Tancredo, o jogo do Colégio Eleitoral da ditadura era claramente um jogo de cartas marcadas. A composição era feita para criar um simulacro de democracia, no qual os delegados eram escolhidos para garantir sempre a eleição do general de plantão para o posto. Do qual a oposição participava quase que só como espectadora. Antes mesmo de Tancredo conseguir quebrar por dentro a regra, Ulysses Guimarães já tinha em 1973 se lançado como anticandidato à Presidência justamente para denunciar que, ali, a eleição acontecia de fato antes da reunião começar. O general Ernesto Geisel elegeu-se então com 400 votos contra 75 dados a Ulysses.

Tancredo quebrou a lógica quando conseguiu tirar de dentro do PDS, o partido que apoiava a ditadura, os votos que deveriam ir para o candidato do governo, Paulo Maluf. A dissidência do PDS virou Frente Liberal, que se tornou depois o PFL, hoje DEM. Aliados ao PMDB de Tancredo, a então batizada Aliança Democrática derrotou a ditadura.

No caso das disputas na Câmara e no Senado, quando as coisas acontecem sem tropeços, os diversos grupos negociam os cargos antes. Nessas ocasiões, tudo acontece sem maiores sustos. Toda vez que essa reunião antes da reunião não acontece, o que no final acabou acontecendo surpreendeu todo mundo. Em 2005, o PT, então no poder, permitiu uma disputa entre Luiz Eduardo Greenhalgh (SP) e Virgílio Guimarães (MG). Acabou vencendo a parada o deputado baixo clero Severino Cavalcanti (PP-PE). Em 2015, o mesmo PT de Dilma Rousseff lançou a candidatura de Arlindo Chinaglia (SP) rompendo com o PMDB, partido do vice Michel Temer. Venceu a eleição Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Na última eleição no Senado, a falta de solidez no apoio a Renan Calheiros (PMDB-AL) fez com que Davi Alcolumbre (DEM-AP) acabasse virando presidente.

Agora, no Senado já aparecem diversos nomes. Alcolumbre apoia Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Mas o MDB quer lançar um nome e retomar o comando. Tem três nomes possíveis na disputa. O senador Otto Alencar (PSD-BA) lança-se como independente.

Na Câmara, o nome do Centrão apoiado pelo governo Arthur Lira (PP-AL) parece sair em vantagem. Mas a parte mais ideológica do mesmo governo fala em apoiar a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS). O grupo de Rodrigo Maia divide-se entre Baleia Rossi (PMDB-SP) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). A esquerda ainda não definiu se sai com candidato próprio ou se apoia alguém.

Enfim, jogo embolado… Reunião que não foi decidida antes de começar. Ninguém costuma saber muito bem qual é o final quando essas disputas viram a crônica do jogo embolado…

Rudolfo Lago